O que farias?

No Mahabharata, "o grande poema do mundo", antes da partida de dados, Krishna e Bhishma conversam sobre as más conseqüências do jogo e sobre a possibilidade de destruição do Darma:

"Krishna balançou a cabeça. Estavam no âmago do pensamento, no próprio centro de suas vidas. O darma: aquela força imperiosa que arrasta os mundos, essa lei do cosmos, presente em todas as coisas e até na matéria humana, em cada indivíduo; reflexo e garantia da ordem universal. Se o homem deixasse de conformar-se a ela, o que seria do cosmos?

Krishna perguntou, olhando diretamente para Bhishma:

- E se tua família, tua raça devessem ser destruídas para salvaguardar o darma? Que farias? Estaria pronto a sacrificar tua raça? O que respondes?

Bhisma levantou-se, num só movimento. De repente, muito agitado, disse:

- Essa questão me mantém alerta todo o tempo. O sono me foge como um inimigo. Durante toda a noite, meu coração bate forte.

- É por isso que te peço: não intervenhas. Deixa que cada um vá até o fundo de si mesmo."
O Mahabharata contado por Jean-Claude Carrière
Tradução Noêmia Arantes - Ed Brasiliense - 1994
No que é realmente importante, creio que de um modo ou de outro, cada um irá, por escolha ou pelos efeitos do carma, até o fundo de si mesmo.


Indizível


Não é o intelecto o que mais importa, mas o que o guia: o caráter, o coração, qualidades generosas, idéias progressivas
. - F. Dostoievski

Hoje quis compartilhar algo sobre os caminhos por onde ando nos últimos dias mas não consegui. Na verdade, não há novidades que se possa descrever ou compartilhar assim. É como andar por uma trilha conhecida mas com um olhar renovado. Tudo está lá como antes mas o olhar é renovado e tudo parece novo.

Então descrever estes caminhos com palavras gastas hoje não tem sentido. Busco palavras e sentenças novas mas não encontro aqui, agora. Encontro no que dizem e disseram tantas outras pessoas notáveis que percorreram outras trilhas, outros caminhos e que me parecem tão próximas hoje.

O que posso dizer é que há aqui um espanto tão grande com tudo que me calo com humildade e na esperança de aprender algo verdadeiro além das tantas ilusões que ainda tenho comigo e com as circunstâncias.

Me sinto bem e há uma paz e uma tranquilidade que nunca senti acompanhada de uma inquietação crescente. É estranho mesmo.

Sabe? Não é um caminho fácil se entregar à vida deste modo. Somos tão vulneráveis e tão menos capazes do que acreditamos algumas vezes... Nos tornamos aos poucos menos condescendentes conosco e mais com os outros.

Descubro aos poucos um espaço para o que é possível, um espaço para metas verdadeiras de aprimoramento e descobertas nas oportunidades de cada escolha do dia a dia. Talvez as únicas metas que valham a pena na vida.

Dá-me a tua mão

Encontrei no Jornal da Poesia este arranjo em versos feito padre Antônio Damázio sobre a prosa de Clarice Lispector do livro "A Paixão segundo GH":

Dá-me a tua mão:
Vou agora te contar
como entrei no inexpressivo
que sempre foi a minha busca cega e secreta.

De como entrei
naquilo que existe entre o número um e o número dois,
de como vi a linha de mistério e fogo,
e que é linha sub-reptícia.

Entre duas notas de música existe uma nota,
entre dois fatos existe um fato,
entre dois grãos de areia por mais juntos que estejam
existe um intervalo de espaço,
existe um sentir que é entre o sentir
- nos interstícios da matéria primordial
está a linha de mistério e fogo
que é a respiração do mundo,
e a respiração contínua do mundo
é aquilo que ouvimos
e chamamos de silêncio.

Não esqueça...

É preciso não esquecer nada
Cecília Meireles

É preciso não esquecer nada:
nem a torneira aberta nem o fogo aceso,
nem o sorriso para os infelizes
nem a oração de cada instante.

É preciso não esquecer de ver a nova borboleta
nem o céu de sempre.

O que é preciso é esquecer o nosso rosto,
o nosso nome, o som da nossa voz, o ritmo do nosso pulso.

O que é preciso esquecer é o dia carregado de
atos,
a
idéia de recompensa e de glória.
O que é preciso é ser como se já não fôssemos,
vigiados pelos próprios olhos
severos
conosco, pois o resto não nos pertence.

(1962)

65 anos de Cinema

Recebi por email da minha mãe uma dica bem bacana para quem gosta de cinema:



Abraços!

Mudanças no blog...

Tentei fazer umas mudanças mas não ficaram boas.

Tento de novo mais tarde porque estou sem tempo.

Lembrando que o blog tem recurso de RSS que podem usar para receberem avisos das atualizações quando ocorrerem.

Se você não sabe bem o que é isto e quiser, pode dar uma lida aqui: Wikipedia: RSS ou procurar no Google por uma explicação mais simples.

:)

Remember

Invictus
William E Henley

Out of the night that covers me,
Black as the Pit from pole to pole,
I thank whatever gods may be
For my unconquerable soul.

In the fell clutch of Circumstance
I have not winced nor cried aloud.
Under the bludgeonings of Chance
My head is bloody, but unbowed.

Beyond this place of wrath and tears
Looms but the Horror of the shade,
And yet the menace of the years
Finds, and shall find me, unafraid.

It matters not how strait the gate,
How charged with punishments the scroll,
I am the master of my fate:
I am the captain of my soul.

IF
Rudyard Kipling

IF you can keep your head when all about you
Are losing theirs and blaming it on you,
If you can trust yourself when all men doubt you,
But make allowance for their doubting too;
If you can wait and not be tired by waiting,
Or being lied about, don't deal in lies,
Or being hated, don't give way to hating,
And yet don't look too good, nor talk too wise:

If you can dream - and not make dreams your master;
If you can think - and not make thoughts your aim;
If you can meet with Triumph and Disaster
And treat those two impostors just the same;
If you can bear to hear the truth you've spoken
Twisted by knaves to make a trap for fools,
Or watch the things you gave your life to, broken,
And stoop and build 'em up with worn-out tools:

If you can make one heap of all your winnings
And risk it on one turn of pitch-and-toss,
And lose, and start again at your beginnings
And never breathe a word about your loss;
If you can force your heart and nerve and sinew
To serve your turn long after they are gone,
And so hold on when there is nothing in you
Except the Will which says to them: 'Hold on!'

If you can talk with crowds and keep your virtue,
Or walk with Kings - nor lose the common touch,
if neither foes nor loving friends can hurt you,
If all men count with you, but none too much;
If you can fill the unforgiving minute
With sixty seconds' worth of distance run,
Yours is the Earth and everything that's in it,
And - which is more - you'll be a Man, my son!

O conhecimento real

Encontrei este texto na internet:

No Japão, um professor alemão, Herrigel, estava aprendendo a arte do arco-e-flecha com um mestre Zen. Ele se tornou perfeito, cem por cento perfeito, não errava nenhum alvo.

Naturalmente, ele disse ao mestre:
- Agora o que resta aprender aqui? Posso ir embora agora?

O mestre respondeu:
- Você pode ir, mas não aprendeu nem o bê-á-bá da minha arte.

Herrigel disse:
- O bê-á-bá da sua arte? Mas eu sempre acerto o alvo!

O mestre replicou:
- Quem está falando em alvo? Qualquer tolo pode fazer isso, basta praticar. Isso não tem nada de mais; agora é que começa a verdade. Quando o arqueiro pega o arco e a flecha e mira o alvo, há três coisas aí: uma é o arqueiro, o mais fundamental e básico, a fonte, a essência; depois há a flecha, o que passará do arqueiro para o alvo; e depois há o "olho do touro", o alvo, o ponto mais distante. Se você acertou o alvo, atingiu o mais distante, tocou na periferia. Você precisa tocar na fonte; você se tornou tecnicamente um especialista em atingir o alvo; mas, se estiver tentando penetrar nas águas mais profundas isso não é muito. Você é um especialista, é uma pessoa de conhecimento, mas não de sabedoria. A flecha se movimenta a partir de você, mas você não sabe de que fonte vem a energia que a movimenta, com qual energia. Como ela se movimenta? Quem a está movimentando? Você não sabe isso, não conhece o arqueiro. Você praticou o arco-e-flecha, o alvo você acertou, sua pontaria foi cem por cento perfeita, você se tornou eficiente com um nível de perfeição de cem por cento, mas isso se refere ao alvo. E você? E o arqueiro? Alguma coisa aconteceu no arqueiro? Sua consciência mudou um pouco? Não, nada mudou. Você é um técnico e não um artista. Você vê as flores de uma árvore, mas esse não é o conhecimento real, a menos que você penetre fundo e conheça as raízes. As flores dependem das raízes; elas nada mais são do que a expressão da essência das raízes. As raízes estão carregando a poesia,a fonte, a seiva que se tornarão as flores, que se tornarão os frutos, que se tornarão as folhas. E, se você contar continuamente somente com as flores, os frutos e as flores e nunca penetrar na escuridão da terra, nunca entenderá a árvore, pois a árvore está nas raízes.

Há que se ir além se quisermos realmente entender.

semáforo

céu acinzentado donde escorre esta chuva
lágrimas que não derramo

vento frio nas folhas e galhos
mudanças

lixo, buzinas, motores, luzes e pessoas
cansado

criança de short e camisa passa só ao meu lado
o chinelo mergulha na poça
o pezinho sacode a água e segue

tem uma lama colada na sua perna

molhado de pé o vejo ir
vento frio na minha blusa molhada
coração aperta

vida, então és isto?

quanto mais vejo
menos compreendo

desaprendi o pensar
sou agora sentidos
memórias e sentimentos

tudo transborda
tudo está contido
tudo está longe

pessoas muito longe

de fato, não sou sabio
quisera ser louco agora

dormir por vários dias
sonho com lençois brancos
cama de hospital

apagar tudo
esquecer tudo
descansar de tudo

para onde?
porque?

tudo que sei
não me serve mais

olhos molhados
os lábios tremem

aperto e seguro
deixo a dor ali

o verde se ilumina
abaixo a cabeça

sigo