Para 2009

Todos os anos novos eu ansiava por novidades e mudanças.

Depois de anos de novidades nas ruas, nas lojas, na escola, no trabalho, na família, com os amigos... Novidades nos livros, nas revistas, nos jornais, nas mensagens eletrônicas, nos telefonemas e nos bate-papos...

Depois de tanta novidades a gente percebe que tudo muda rápido demais... e o novo vem sempre tão belo, tão forte... E tudo que era bom parece antigo... E tudo parece passar logo e tudo parece tão gasto... Tão desnecessário... Será?

Todas as mesmices do ano passado e de todos os anos passados... É o que desejo agora pois vieram todas por minhas escolhas e não quero mudar nada do que veio mas quero apenas mudar o Olhar, mudar o Ser... Para ser Novo, para Novas escolhas.

Oxalá a única grande e verdadeira e profunda mudança em 2009 aconteça em mim! E se me permitires desejar, também em você! É este o voto mais valioso para mim. Além disto...

Felicidades, amor, saúde, paz e pesetas!

Porque são de felicidades, das felicidades dos pequenos milagres breves ou duradouros que nos alimentamos nesta jornada. As felicidades só vêm quando estamos de olhos abertos, sentidos aguçados e mergulhados na vida... Então que venham muitas felicidades para você!

Porque precisamos de amor! Precisamos Do Amor, precisamos de amores! Precisamos do amor do espírito, do amor transcendente, do amor fraterno, do amor paternal, do amor maternal, do amor filial, do amor carnal... Repetindo, eu sei... Precisamos de amor!

Porque precisamos de saúde e por mais que nos cuidemos e ponhamos esforços na busca da saúde devemos sempre também pedir e orar por nós e para os outros saúde e força para os momentos difíceis de doenças.

Porque precisamos de paz... Precisamos de paz no trabalho, precisamos de paz em nosso lar, precisamos de paz na nossa rua, no bairro, na cidade, no pais, no mundo... Precisamos por fim às guerras e as batalhas injustas e tolas.

E por último porque não te desejar "pesetas"? Nada demais para que não te pese na jornada mas o justo e necessário para que possas seguir a tua jornada com dignidade e com as pessoas que ama sem violentar o corpo ou a alma.

Estes são meus votos para 2009 para ti.

Beijos e abraços!

Fernando.

Questão de criação...

17/12/2008 - 12h12
UOL Notícias
Em São Paulo

Menina encontra R$ 20 mil em casaco doado a vítimas de enchentes em Santa CatarinaDo Uma menina de cinco anos encontrou R$ 20 mil escondidos em um casaco recebido por sua família como doação, após perder tudo na região do Alto Baú, em Ilhota, no Vale do Itajaí, durante as enchentes que castigaram Santa Catarina. As informações são do portal 'Diário Catarinense'.

O avô da menina, Daniel Manoel da Silva, 58 anos, foi atrás do doador, que é morador de Concórdia, município no Meio-Oeste catarinense, para devolver o dinheiro. "Se o dinheiro fosse entregue nas minhas mãos, teria aceitado com certeza, pois agora precisamos. Mas é uma questão de criação, fui educado assim e estou com a consciência limpa" afirmou Daniel ao 'Diário Catarinense'. Segundo o portal, ele recebeu R$ 1 mil pela honestidade.

A menina Daniele Maria Annater, 5 anos, brincava com o casaco quando encontrou o dinheiro escondido na manga. Nem a mãe nem as tias da menina haviam se interessado pela peça, considerada uma roupa muito fina para o estilo de vida da família, e iriam repassá-la para outros desabrigados.

Daniel Manoel da Silva, que plantava cana e fabricava cachaça artesanal, perdeu cinco familiares no dia 23 de novembro, quando a casa nova da família foi encoberta pela lama. Luis Paulo Hostim, 17 anos, João Pedro Silva, um ano e oito meses, Joana Maria Annater, sete meses, Nelson Galdino da Silva, 62 anos, e Maria Tatiana Hostim, sete meses, morreram soterrados.

Com informações do 'Diário Catarinense'

Grilos

Marina Machado cantando "Grilos" ao vivo no programa Radiola na TV Cultura:



Grilos
Roberto Carlos e Erasmo Carlos

Se você passar daquela porta
Você vai ver
Como é que são as coisas
Como é que estão as coisas
Sei que o mundo pesa muitos quilos
Não leve a mal se eu lhe pedir
Para cortar os grilos
Pra cortar os grilos
Pra cortar os grilos
Pra cortar os grilos
Aí, então, você vai se convencer
Que se o mundo pesa
Não vai ser de reza
Que você vai viver
Descanse um pouco
E amanheça aqui comigo
Sou seu amigo, você vai ver
Sou seu amigo, você vai ver

Verde...

Aperta o "play" e canta comigo...



Interpretação na harmonica de Marcelo Batista.


Vai... Tenta... A letra está aqui:

Verde
Eduardo Gudin / J.C. Costa Neto


Quem pergunta por mim

Já deve saber

Do riso no fim
De tanto sofrer
Que eu não desisti
Das minhas bandeiras
Caminho, trincheiras, da noite

Eu, que sempre apostei
Na minha paixão
Guardei um país no meu coração
Um foco de luz, seduz a razão
De repente a visão da esperança
Quis esse sonhador
Aprendiz de tanto suor
Ser feliz num gesto de amor
Meu país acendeu a cor

Verde, as matas no olhar, ver de perto
Ver de novo um lugar, ver adiante
Sede de navegar, verdejantes tempos
Mudança dos ventos no meu coração

Verde, as matas no olhar, ver de perto
Ver de novo um lugar, ver adiante
Sede de navegar, verdejantes tempos
Mudança dos ventos no meu coração

Verdejantes tempos
Mudança dos ventos no meu coração

Verdejantes tempos
Mudança dos ventos no meu coração

No meu coração...

Palmas os autores desta linda música, palmas para o Marcelo (que não conheço mas que nos proporcionou este bom momento e palmas para nós que cantamos juntos e nos divertimos!!!

Rascunho

Muitas vezes ainda tenho a ilusão de que tenho vários caminhos à disposição e várias escolhas para ser nesta vida.

Preciso me lembrar de que não é assim. Não rejeito o livre arbítrio mas a idéia de que podemos ser o que não somos e assim, dar passos que não podemos dar e andar por caminhos que não estão disponiveis.

Estas são fontes de muita dor e sofrimento e causam impactos profundos muito além de minha vida.

No entanto, esta crença é natural porque faz parte das ideologias em que vivo imerso e na crença banalizada da "liberdade".

Sou livre mas meu caminho é único e singular. Cada passo que dou faz esta trilha que reflete o movimento de meu ser. Não posso dar o passo de outros nem posso seguir os caminhos deles embora pareçam possíveis.

Se estou nesta trilha com integridade na busca de ser e mudo meu rumo diante do que se apresenta no caminho e não só guiado por ideias ou comodidades, ou comparando a paisagem de minha vida com outras, então mudo as paisagens mas sigo firme no meu caminho.

E nem posso antever aonde vai dar a estrada. Só posso saber e buscar com honestidade o próximo passo diante do que se apresenta a cada momento, todos os dias em minha vida confiante de que nada nesta paisagem ou neste caminho está ali por acaso.

Tudo é parte deste mistério em que estou inserido e que já está posto, não como uma imposição sobre o ser ou supressão de minha liberdade mais verdadeira... Tudo está posto naturalmente de acordo com meu movimento e assim, de acordo com o ser.

Também cada passo é individual, a escolha é individual mas as conseqüencias e os resultados terão um impacto muito além de minha vida.

Rejeitar o passo é comprometer estes impactos, é comprometer vidas e o próprio universo.

Os ensinamentos de que tudo podemos e de que somos livres para tudo orientam muitos outros seres que acabam muitas vezes por se negarem a dar os passos que lhe cabem e assim sofremos todos os impactos de escolhas alheias que se multiplicam já que tudo se interliga e se relaciona.

Assim, identificando ou não as causas, sofremos e sofreremos sempre os impactos das escolhas dos outros. E diante disto precisamos dar a nossa resposta decidindo se buscamos e cumprimos nosso destino ou se o rejeitamos contribuindo para o caos.

Não há sentido em imaginar que posso tomar outro caminho, ou dar outros passos com escolhas que para outros parecem adequadas e apropriadas. Podem ser boas para os outros e pode ser que os outros estejam rejeitando o que lhes cabe também. Como saber?

Só me cabe ser e dar cada passo nesta trilha consciente de que a estrada e as paisagens são uma ilusão mas que as escolhas e meu compromisso honesto com o caminho fazem parte da jornada maior para que estou destinado. E por isto, cada passo nesta trilha tem um impacto que não posso avaliar no universo como o conheço e talvez um impacto muito além no que nem posso imaginar que exista.

Isto tudo é um mistério mas também parece cada dia mais evidente. De fato, tudo isto também já foi dito e muitas palavras e experiências começam a fazer mais sentido agora embora ainda seja difícil...

Sigo.

Pausa

Aqui é dor, aqui é amor, aqui é amor e dor:
onde um homem projeta seu perfil e pergunta atônito:
em que direção se vai?”


Adélia Prado
O Coração Disparado
Ed. Record

Registro

Não, não viemos para esta vida apenas a passeio. Há muito que se buscar e ainda vivo com tantas vanidades...

O evangelho de hoje fala disto: Lc:12, 13-21. Possamos ser cada vez mais ricos aos olhos Dele, olhando, ouvindo, falando, sentindo e saboreando a vida como crianças conforme foi ensinado:

"Deixai vir a mim os pequequinos e não os impeçais, porque o Reino de Deus é daqueles que se lhes assemelham. Em verdade vos digo: todo o que não receber o Reino de Deus com a mentalidade de uma criança, nele não entrará." Mc:10, 14-15.

Por todos para que de um modo ou de outro, hoje ou em algum outro dia, recebam o Reino de justiça, paz e amor.

E se...


"E se é verdade que o tempo não volta, também deveria ser verdade que os amigos não se perdem."


Caio Fernando Abreu



Quando Vier a Primavera

Quando Vier a Primavera
Alberto Caeiro

Quando vier a Primavera,
Se eu já estiver morto,
As flores florirão da mesma maneira
E as árvores não serão menos verdes que na Primavera passada.
A realidade não precisa de mim.
Sinto uma alegria enorme
Ao pensar que a minha morte não tem importância nenhuma

Se soubesse que amanhã morria
E a Primavera era depois de amanhã,
Morreria contente, porque ela era depois de amanhã.
Se esse é o seu tempo, quando havia ela de vir senão no seu tempo?
Gosto que tudo seja real e que tudo esteja certo;
E gosto porque assim seria, mesmo que eu não gostasse.
Por isso, se morrer agora, morro contente,
Porque tudo é real e tudo está certo.

Podem rezar latim sobre o meu caixão, se quiserem.
Se quiserem, podem dançar e cantar à roda dele.
Não tenho preferências para quando já não puder ter preferências.
O que for, quando for, é que será o que é.



Segue o teu destino

Segue o teu destino,
Rega as tuas plantas,
Ama as tuas rosas.
O resto é a sombra
De árvores alheias.

A realidade
Sempre é mais ou menos
Do que nós queremos.
Só nós somos sempre
Iguais a nós-próprios.

Suave é viver só.
Grande e nobre é sempre
Viver simplesmente.
Deixa a dor nas aras
Como ex-voto aos deuses.

Vê de longe a vida.
Nunca a interrogues.
Ela nada pode
Dizer-te. A resposta
Está além dos deuses.

Mas serenamente
Imita o Olimpo
No teu coração.
Os deuses são deuses
Porque não se pensam.

Ricardo Reis

Das vantagens de ser bobo

Das vantagens de ser bobo
Clarice Lispector

"O bobo, por não se ocupar com ambições, tem tempo para ver, ouvir e tocar o mundo. O bobo é capaz de ficar sentado quase sem se mexer por duas horas. Se perguntado por que não faz alguma coisa, responde: "Estou fazendo. Estou pensando."

Ser bobo às vezes oferece um mundo de saída porque os espertos só se lembram de sair por meio da esperteza, e o bobo tem originalidade, espontaneamente lhe vem a idéia.

O bobo tem oportunidade de ver coisas que os espertos não vêem. Os espertos estão sempre tão atentos às espertezas alheias que se descontraem diante dos bobos, e estes os vêem como simples pessoas humanas. O bobo ganha utilidade e sabedoria para viver. O bobo nunca parece ter tido vez. No entanto, muitas vezes, o bobo é um Dostoievski.

Há desvantagem, obviamente. Uma boba, por exemplo, confiou na palavra de um desconhecido para a compra de um ar refrigerado de segunda mão: ele disse que o aparelho era novo, praticamente sem uso porque se mudara para a Gávea onde é fresco. Vai a boba e compra o aparelho sem vê-lo sequer. Resultado: não funciona. Chamado um técnico, a opinião deste era de que o aparelho estava tão estragado que o conserto seria caríssimo: mais valia comprar outro. Mas, em contrapartida, a vantagem de ser bobo é ter boa-fé, não desconfiar, e portanto estar tranqüilo. Enquanto o esperto não dorme à noite com medo de ser ludibriado. O esperto vence com úlcera no estômago. O bobo não percebe que venceu.

Aviso: não confundir bobos com burros. Desvantagem: pode receber uma punhalada de quem menos espera. É uma das tristezas que o bobo não prevê. César terminou dizendo a célebre frase: "Até tu, Brutus?"

Bobo não reclama. Em compensação, como exclama!

Os bobos, com todas as suas palhaçadas, devem estar todos no céu. Se Cristo tivesse sido esperto não teria morrido na cruz.

O bobo é sempre tão simpático que há espertos que se fazem passar por bobos. Ser bobo é uma criatividade e, como toda criação, é difícil. Por isso é que os espertos não conseguem passar por bobos. Os espertos ganham dos outros. Em compensação os bobos ganham a vida. Bem-aventurados os bobos porque sabem sem que ninguém desconfie. Aliás não se importam que saibam que eles sabem.

Há lugares que facilitam mais as pessoas serem bobas (não confundir bobo com burro, com tolo, com fútil). Minas Gerais, por exemplo, facilita ser bobo. Ah, quantos perdem por não nascer em Minas!

Bobo é Chagall, que põe vaca no espaço, voando por cima das casas. É quase impossível evitar excesso de amor que o bobo provoca. É que só o bobo é capaz de excesso de amor. E só o amor faz o bobo."
Beijos e abraços e uma ótima semana para todos!


Renascer

Sol de Primavera
Beto Guedes e Ronaldo Bastos

Quando entrar setembro e a boa nova entrar nos campos
quero ver brotar o perdão onde a gente plantou juntos outra vez

Já sonhamos juntos semeando as canções no vento
quero ver crescer nossa voz no que falta sonhar

Já choramos muito, muitos se perderam no caminho
Mesmo assim não custa inventar uma nova canção que venha nos trazer

Sol de primavera abre as janelas do meu peito
A lição sabemos de cor só nos resta aprender



Amor de índio
Beto Guedes e Ronaldo Bastos

Tudo que move é sagrado e remove as montanhas com todo cuidado, meu amor
Enquanto a chama arder todo dia te ver passar

Tudo viver a teu lado com o arco da promessa do azul pintado pra durar

Abelha fazendo mel vale o tempo que não voou
A estrela caiu do céu, o pedido que se pensou

O destino que se cumpriu de sentir seu calor e ser todo
Todo dia é de viver para ser o que for e ser tudo

Sim, todo amor é sagrado e o fruto do trabalho
É mais que sagrado, meu amor

A massa que faz o pão vale a luz do teu suor

Lembra que o sono é sagrado e alimenta de horizontes
O tempo acordado de viver

No inverno te proteger, no verão sair pra pescar
No outono te conhecer, primavera poder gostar

No estio me derreter pra na chuva dançar e andar junto

O destino que se cumpriu de sentir seu calor e ser tudo

Observando

"...
Que ideia tenho eu das cousas?
Que opinião tenho sobre as causas e os efeitos?

Que tenho eu meditado sobre Deus e a alma

E sobre a criação do Mundo?

Não sei. Para mim pensar nisso é fechar os olhos

E não pensar. É correr as cortinas

Da minha janela (mas ela não tem cortinas).

..."

O Guardador de Rebanhos (V) - Alberto Caeiros

O que farias?

No Mahabharata, "o grande poema do mundo", antes da partida de dados, Krishna e Bhishma conversam sobre as más conseqüências do jogo e sobre a possibilidade de destruição do Darma:

"Krishna balançou a cabeça. Estavam no âmago do pensamento, no próprio centro de suas vidas. O darma: aquela força imperiosa que arrasta os mundos, essa lei do cosmos, presente em todas as coisas e até na matéria humana, em cada indivíduo; reflexo e garantia da ordem universal. Se o homem deixasse de conformar-se a ela, o que seria do cosmos?

Krishna perguntou, olhando diretamente para Bhishma:

- E se tua família, tua raça devessem ser destruídas para salvaguardar o darma? Que farias? Estaria pronto a sacrificar tua raça? O que respondes?

Bhisma levantou-se, num só movimento. De repente, muito agitado, disse:

- Essa questão me mantém alerta todo o tempo. O sono me foge como um inimigo. Durante toda a noite, meu coração bate forte.

- É por isso que te peço: não intervenhas. Deixa que cada um vá até o fundo de si mesmo."
O Mahabharata contado por Jean-Claude Carrière
Tradução Noêmia Arantes - Ed Brasiliense - 1994
No que é realmente importante, creio que de um modo ou de outro, cada um irá, por escolha ou pelos efeitos do carma, até o fundo de si mesmo.


Indizível


Não é o intelecto o que mais importa, mas o que o guia: o caráter, o coração, qualidades generosas, idéias progressivas
. - F. Dostoievski

Hoje quis compartilhar algo sobre os caminhos por onde ando nos últimos dias mas não consegui. Na verdade, não há novidades que se possa descrever ou compartilhar assim. É como andar por uma trilha conhecida mas com um olhar renovado. Tudo está lá como antes mas o olhar é renovado e tudo parece novo.

Então descrever estes caminhos com palavras gastas hoje não tem sentido. Busco palavras e sentenças novas mas não encontro aqui, agora. Encontro no que dizem e disseram tantas outras pessoas notáveis que percorreram outras trilhas, outros caminhos e que me parecem tão próximas hoje.

O que posso dizer é que há aqui um espanto tão grande com tudo que me calo com humildade e na esperança de aprender algo verdadeiro além das tantas ilusões que ainda tenho comigo e com as circunstâncias.

Me sinto bem e há uma paz e uma tranquilidade que nunca senti acompanhada de uma inquietação crescente. É estranho mesmo.

Sabe? Não é um caminho fácil se entregar à vida deste modo. Somos tão vulneráveis e tão menos capazes do que acreditamos algumas vezes... Nos tornamos aos poucos menos condescendentes conosco e mais com os outros.

Descubro aos poucos um espaço para o que é possível, um espaço para metas verdadeiras de aprimoramento e descobertas nas oportunidades de cada escolha do dia a dia. Talvez as únicas metas que valham a pena na vida.

Dá-me a tua mão

Encontrei no Jornal da Poesia este arranjo em versos feito padre Antônio Damázio sobre a prosa de Clarice Lispector do livro "A Paixão segundo GH":

Dá-me a tua mão:
Vou agora te contar
como entrei no inexpressivo
que sempre foi a minha busca cega e secreta.

De como entrei
naquilo que existe entre o número um e o número dois,
de como vi a linha de mistério e fogo,
e que é linha sub-reptícia.

Entre duas notas de música existe uma nota,
entre dois fatos existe um fato,
entre dois grãos de areia por mais juntos que estejam
existe um intervalo de espaço,
existe um sentir que é entre o sentir
- nos interstícios da matéria primordial
está a linha de mistério e fogo
que é a respiração do mundo,
e a respiração contínua do mundo
é aquilo que ouvimos
e chamamos de silêncio.

Não esqueça...

É preciso não esquecer nada
Cecília Meireles

É preciso não esquecer nada:
nem a torneira aberta nem o fogo aceso,
nem o sorriso para os infelizes
nem a oração de cada instante.

É preciso não esquecer de ver a nova borboleta
nem o céu de sempre.

O que é preciso é esquecer o nosso rosto,
o nosso nome, o som da nossa voz, o ritmo do nosso pulso.

O que é preciso esquecer é o dia carregado de
atos,
a
idéia de recompensa e de glória.
O que é preciso é ser como se já não fôssemos,
vigiados pelos próprios olhos
severos
conosco, pois o resto não nos pertence.

(1962)

65 anos de Cinema

Recebi por email da minha mãe uma dica bem bacana para quem gosta de cinema:



Abraços!

Mudanças no blog...

Tentei fazer umas mudanças mas não ficaram boas.

Tento de novo mais tarde porque estou sem tempo.

Lembrando que o blog tem recurso de RSS que podem usar para receberem avisos das atualizações quando ocorrerem.

Se você não sabe bem o que é isto e quiser, pode dar uma lida aqui: Wikipedia: RSS ou procurar no Google por uma explicação mais simples.

:)

Remember

Invictus
William E Henley

Out of the night that covers me,
Black as the Pit from pole to pole,
I thank whatever gods may be
For my unconquerable soul.

In the fell clutch of Circumstance
I have not winced nor cried aloud.
Under the bludgeonings of Chance
My head is bloody, but unbowed.

Beyond this place of wrath and tears
Looms but the Horror of the shade,
And yet the menace of the years
Finds, and shall find me, unafraid.

It matters not how strait the gate,
How charged with punishments the scroll,
I am the master of my fate:
I am the captain of my soul.

IF
Rudyard Kipling

IF you can keep your head when all about you
Are losing theirs and blaming it on you,
If you can trust yourself when all men doubt you,
But make allowance for their doubting too;
If you can wait and not be tired by waiting,
Or being lied about, don't deal in lies,
Or being hated, don't give way to hating,
And yet don't look too good, nor talk too wise:

If you can dream - and not make dreams your master;
If you can think - and not make thoughts your aim;
If you can meet with Triumph and Disaster
And treat those two impostors just the same;
If you can bear to hear the truth you've spoken
Twisted by knaves to make a trap for fools,
Or watch the things you gave your life to, broken,
And stoop and build 'em up with worn-out tools:

If you can make one heap of all your winnings
And risk it on one turn of pitch-and-toss,
And lose, and start again at your beginnings
And never breathe a word about your loss;
If you can force your heart and nerve and sinew
To serve your turn long after they are gone,
And so hold on when there is nothing in you
Except the Will which says to them: 'Hold on!'

If you can talk with crowds and keep your virtue,
Or walk with Kings - nor lose the common touch,
if neither foes nor loving friends can hurt you,
If all men count with you, but none too much;
If you can fill the unforgiving minute
With sixty seconds' worth of distance run,
Yours is the Earth and everything that's in it,
And - which is more - you'll be a Man, my son!

O conhecimento real

Encontrei este texto na internet:

No Japão, um professor alemão, Herrigel, estava aprendendo a arte do arco-e-flecha com um mestre Zen. Ele se tornou perfeito, cem por cento perfeito, não errava nenhum alvo.

Naturalmente, ele disse ao mestre:
- Agora o que resta aprender aqui? Posso ir embora agora?

O mestre respondeu:
- Você pode ir, mas não aprendeu nem o bê-á-bá da minha arte.

Herrigel disse:
- O bê-á-bá da sua arte? Mas eu sempre acerto o alvo!

O mestre replicou:
- Quem está falando em alvo? Qualquer tolo pode fazer isso, basta praticar. Isso não tem nada de mais; agora é que começa a verdade. Quando o arqueiro pega o arco e a flecha e mira o alvo, há três coisas aí: uma é o arqueiro, o mais fundamental e básico, a fonte, a essência; depois há a flecha, o que passará do arqueiro para o alvo; e depois há o "olho do touro", o alvo, o ponto mais distante. Se você acertou o alvo, atingiu o mais distante, tocou na periferia. Você precisa tocar na fonte; você se tornou tecnicamente um especialista em atingir o alvo; mas, se estiver tentando penetrar nas águas mais profundas isso não é muito. Você é um especialista, é uma pessoa de conhecimento, mas não de sabedoria. A flecha se movimenta a partir de você, mas você não sabe de que fonte vem a energia que a movimenta, com qual energia. Como ela se movimenta? Quem a está movimentando? Você não sabe isso, não conhece o arqueiro. Você praticou o arco-e-flecha, o alvo você acertou, sua pontaria foi cem por cento perfeita, você se tornou eficiente com um nível de perfeição de cem por cento, mas isso se refere ao alvo. E você? E o arqueiro? Alguma coisa aconteceu no arqueiro? Sua consciência mudou um pouco? Não, nada mudou. Você é um técnico e não um artista. Você vê as flores de uma árvore, mas esse não é o conhecimento real, a menos que você penetre fundo e conheça as raízes. As flores dependem das raízes; elas nada mais são do que a expressão da essência das raízes. As raízes estão carregando a poesia,a fonte, a seiva que se tornarão as flores, que se tornarão os frutos, que se tornarão as folhas. E, se você contar continuamente somente com as flores, os frutos e as flores e nunca penetrar na escuridão da terra, nunca entenderá a árvore, pois a árvore está nas raízes.

Há que se ir além se quisermos realmente entender.

semáforo

céu acinzentado donde escorre esta chuva
lágrimas que não derramo

vento frio nas folhas e galhos
mudanças

lixo, buzinas, motores, luzes e pessoas
cansado

criança de short e camisa passa só ao meu lado
o chinelo mergulha na poça
o pezinho sacode a água e segue

tem uma lama colada na sua perna

molhado de pé o vejo ir
vento frio na minha blusa molhada
coração aperta

vida, então és isto?

quanto mais vejo
menos compreendo

desaprendi o pensar
sou agora sentidos
memórias e sentimentos

tudo transborda
tudo está contido
tudo está longe

pessoas muito longe

de fato, não sou sabio
quisera ser louco agora

dormir por vários dias
sonho com lençois brancos
cama de hospital

apagar tudo
esquecer tudo
descansar de tudo

para onde?
porque?

tudo que sei
não me serve mais

olhos molhados
os lábios tremem

aperto e seguro
deixo a dor ali

o verde se ilumina
abaixo a cabeça

sigo

Frases e Imagens - Cecilia

Renova-te
Renasce em ti mesmo
Multiplica os teus olhos, para verem mais
Multiplica-se os teus braços para semeares tudo
Destrói os olhos que tiverem visto
Cria outros, para as visões novas
Destrói os braços que tiverem semeado
Para se esquecerem de colher
Sê sempre o mesmo,
Sempre outro
Mas sempre alto
Sempre longe
E dentro de tudo.

Cântico XIII
Cecília Meireles


Quatro encontros

¿Y si las historias para niños fueran de lectura obligatoria para los adultos? ¿Seriamos realmente capaces de aprender lo que, desde hace tanto tiempo venimos enseñando?
José Saramago

Sexta

A peça A Alma Imoral de Clarice Niskier adaptada do texto de Nilton Bonder. Assisti pela segunda. Obra maravilhosa que toca, envolve e que me deixou ecos que perduram além dos momentos que passei no teatro neste encontro com as suas palavras, interpretações e comigo.

Sábado

A peça "Fragments" de Samuel Beckett com direção de Peter Brook. Oportunidade rara de assistir o trabalho de Brook que busca na economia da forma a essência do diálogo e da arte dramática. Também deixou ecos e imagens que não posso descrever para não perder algo na imperfeição de minhas palavras.

Domingo

O pequeno vídeo "A Flor Máis Grande do Mundo" que encontrei no You Tube. E que copiei aqui para você assistir. Nada também que se possa dizer além do que já está lá. Nem precisa saber espanhol porque usa da linguagem que está acima da língua escrita dos adultos.



O momento mágico em que minha pequena sobrinha se levantou do chão onde lia um livrinho e correu para me abraçar no Domingo de noite quando a encontrei.

Uma ótima semana para todos! Com amor, saúde, paz e o desejo sincero de que possas encontrar alimentos como estes para tua vida nesta semana, neste mês, neste ano...

Sempre!

Comerciais

Vocês sabem, tem aqueles comerciais....

Comerciais de margarina, apartamentos, carros, celulares, peru de natal... Recortes de pessoas, famílias, casais, filhos, pais e amigos perfeitos sempre associados aos produtos anunciados.

Imagens e recortes onde todos estão sempre sorrindo, superando dificuldades, atingindo seus objetivos, celebrando os momentos maravilhosos de felicidade.

Claro que não se venderiam estas coisas se apresentassem alguns recortes mais próximos da vida real das pessoas e de suas famílias.

Não preciso explicar do que estou falando. Todos conhecemos estes comerciais que criam desejos de conforto e sonhos de felicidades mas todos sabemos bem o que é o dia-a-dia na nossa vida e na vida de tantas pessoas ao nosso redor.

Eu ainda me surpreendo em ver como muita gente busca (sem dar conta disto inteiramente) fazer que suas vidas pareçam como aqueles retratos dos comerciais. É claro que estas pessoas sabem bem que é um comercial e que tudo ali foi preparado para fazer a gente comprar...

Ou será que não sabem?

As formas em si não são ruins mas se focamos na forma esquecemos de que elas não existem como os objetos que procuram vender. Então há o risco de acreditar inconscientemente que estas formas são ideais e objetivos adequados, apropriados e normais.

Difícil perceber que as formas perfeitas são anormalidades.

Quando fixamos objetivos para nossa vida nestes recordes e formas de fora corremos o risco de estreitar o olhar porque estabelecemos estes objetivos como o padrão do que é certo e tudo o mais se torna desvio, erro e falhas que precisam ser corrigidas ou toleradas.

Todos temos problemas todos os dias, desde quando nos levantamos até dormir. O tempo é curto para tudo que temos vontade ou precisamos fazer. As pessoas ao nosso redor tem necessidades como nós e somos sempre chamados para atender, ajudar e participar.

Se ficamos olhando para estas formas dos comerciais, ou para os ideais das revistas e objetivos que as empresas procuram nos vender, a vida se embota porque se torna um tragico laboratório aonde ensaiamos sonhos para que tudo "funcione" perfeitamente.

Assim, sofremos mais do que deveríamos porque de um modo ou de outro caimos na ilusão de que estas formas ilusórias existem em algum lugar mas não existem em nossa vida.

E assim, deixamos de viver o presente, deixamos de perceber os acontecimentos e dádivas reais. O presente, a realidade de cada individuo e das relações, o que é torna-se materia bruta que precisa ser modificada para se tornar um ideal, deixamos o ser pelo não-ser.

Nestas buscas, lutamos por ideais que são fantasias de formas anormais.

Porque o normal está aí no teu dia a dia. O normal e o real são as dificuldades, fraquezas, e todas estas pedras no caminho de nossa vida e da vida de todas as pessoas que encontramos. Somente sobre isto podemos dar respostas autênticas.

Reais são algumas pessoas que encontramos e nos dão belos exemplos de sabedoria porque mesmo diante de dificuldades imensas estão sempre em atitude de gratidão com a vida porque se entregam inteiros para o presente, para o próximo e para o que são.

Ah! A sabedoria de poder se encantar com o mundo sem escolher a cegueira!

Para o universo tudo que acontece no mundo e com as pessoas não é bom ou mal e tudo há de passar. Porém é inegável e inequívoco que há um bom e um mal e existem juntos, ao mesmo tempo, ainda que não possamos compreender com nossas limitações humanas.

Então, mesmo diante das dores, dos sofrimentos e dificuldades ainda existirá ali beleza, mudanças em andamento, renovação, altruísmo, honestidade, amor, sinceridade, caráter, humildade, sonhos por realizar, conquistas pessoais latentes...

Este talvez seja o caminho... Poder ver que tudo está posto no mundo como estamos nós também e mesmo que nos pareçam pedras em nosso caminho, tudo isto é também alimento da vida. São como se diz na Oração: o pão nosso de cada dia.

Alimentos da vida porque nos chamam para a realidade que nos cerca, chamam para o presente e para as pessoas ao nosso redor, chamam para rompermos com tudo que nos leva à estagnação, rompermos com o que nos leva para a morte e para o não-ser.

Isto é o normal, estas são as matéria da vida e os alimentos do ser. Não deveríamos trocar bons alimentos por fantasias e ideais ilusórios porque pagaremos muito caro.

Possamos acolher as utopias e os sonhos porque também precisamos deles mas é somente sobre estas pedras-pães que devemos nos debruçar e obrarmos sem buscar uma forma idealizada que dissem ser mais correta ou que imaginamos ser mais confortável.

Sobre isto devemos lutar o bom combate buscando o possível, com o que temos e somos, respeitando no outro e em nós mesmos: ritmos, limites, dificuldades, sonhos etc.

Só assim, creio que podermos estar no caminho desta tal felicidade que já não terá forma e que justamente por isto, poderá romper das formas mais inesperadas e inimagináveis: muitas e muitas vezes como fonte interminável de milagres nesta jornada com pedras e pães.

Envelhecer

"Não tenhamos pressa, mas não percamos tempo."
José Saramago



Um ótimo final de semana para todos!

Queres tocar esta flauta?

[HAMLET]
- Não estou compreendendo muito bem. Queres tocar esta flauta?

[GUILDBNSTERN]
- Não sei tocar, meu senhor.

[HAMLET]
- Mas estou pedindo.

[GUILDBNSTERN]
- Podeis acreditar-me: não sei.

[HAMLET]
- Suplico.

[GUILDBNSTERN]
- Não sei tocá-la, senhor.

[HAMLET]
- É tão fácil quanto mentir. Aperta estes furos com os dedos e o polegar; dá-lhe ar com os lábios e o instrumento deixará sair a mais eloqüente melodia. Vê: aqui estão os registros.

[GUILDBNSTERN]
- Mas, não possuindo prática, não conseguiria tirar qualquer som.

[HAMLET]
- Pois, então, que indigna criatura acreditas que eu seja? Estás querendo fazer de mim um divertimento; estás procurando aparentar que conheces meus registros; estás querendo ,arrancar os meus segredos mais íntimos; pretendes sondar-me, fazendo que emita desde a nota, mais grave até a mais aguda de meu diapasão; e possuindo tal abundância de música e tão excelente voz neste pequeno órgão, tu, contudo, não podes fazê-lo falar. Pelo sangue de Deus! Estás pensando que seja eu mais fácil de ser tocado que uma flauta? Toma-me pelo instrumento que melhor te agrade e por muito que me dedilhes, posso garantir-te que não conseguirás tirar qualquer som de mim.

Hamlet, príncipe da Dinamarca. Ato III, Cena II.
William Shakespeare

De volta ao manual...

Faz algum tempo que não escrevo aqui.

Trabalho, cursos e viagens complicaram os horários e acabei me deixando ficar no modo "automático" e assim me afasto da consciência do que acontece comigo e ao meu redor em troca de resultados, prazos e confortos.

Existem dois modos de ser: automático e manual. Lembra do câmbio do carro?

No câmbio automático, pisamos no pedal e ele anda sem nos preocuparmos com as mudanças de câmbio. No câmbio manual precisamos mudar a relação de câmbio ouvindo o motor e avaliando cada situação que vamos enfrentar: subidas, paradas, ultrapassagens etc.

Podemos viver de um modo ou de outro. Um não é pior do que o outro e cada um tem suas vantagens e desvantagens. Como sempre é uma escolha de cada um que se refaz a cada momento. O problema é quando nos esquecemos de que existem as duas possibilidades...

Do mesmo modo como no carro, as pessoas que se habituam ao câmbio automático tem mais dificuldades em dirigir no manual. Já vi isto com pessoas que usaram por toda vida carros automáticos e que tem medo de guiar carros com câmbio manual.

O inverso já não ocorre do mesmo modo. Quando pego um carro automático estranho também mas o estranhamento não me impede de guiar sem problemas. O estranhamento nos desperta. E despertos já não estamos no automático, mesmo que o carro esteja...

Para mim, andar no manual da vida é buscar a consciencia do que me acontece e do que acontece ao meu redor, buscar me orientar e escolher. É não aceitar todas as respostas mas fazer perguntas e me dispor em rever idéias e fazer mudanças.

Viver com consciência é escolher minha comida, minha roupa, o modo como vou dispor meu corpo na cadeira, prestar atenção nos meus passos, fazer perguntas de crianças...

Vivendo assim a gente acorda de manhã e lembra que há um novo dia para viver e que nem sabemos se vamos estar vivos no final do dia. E lembramos que todo ato terá consequências mesmo que não tenhamos a menor idéia de quais sejam...

Enfim, nos tormamos responsáveis e dá um trabalho danado.

Assim, várias vezes escolho pelo automatico, simplesmente porque nestas horas só quero ir, sem me importar em como as engrenagens vão se mover para me dar o resultado e o conforto que desejo.

Porém, como nas viagens que já fiz, onde usei os automáticos, chega a hora de voltar para casa até porque viajar é bom e o automático é bom mas a gente fica com saudades e precisa voltar.

E como nas viagens, adoro voltar para meu carro: durinho e com câmbio manual. É então que posso guiar atento ao ronco do motor, aos instrumentos, ao movimento dos carros e pedestres, aos sinais, aos meus objetivos e desejos.

Prazer único e indescritível de escolher: como quero ir, como quero viver.

Vida, morte, relacionamentos, conversas, entendimento, tênis e frescobol.

Peço desculpas porque escrevi muito. Minha falta de tempo vai tomar teu tempo se você tiver a boa vontade de me ler... Porém acho que vale a pena ler, com calma as linhas a seguir. Há um depoimento e uma prosa. Como é longo, começe por onde preferir.

Ano passado, uma separação difícil. Além da dificuldade do afastamento, das saudades, e dos receios, havia também a frustração com o sentimento de fracasso e muitas dúvida: o que deu errado? Poderia ter sido diferente? Pode ser?

Um dia, encontrei no blog da Sandra, A Frase do Dia, esta frase de Nietzsche:

"As relações que desafiam o tempo são aquelas construídas sobre a arte de conversar".

Eu sempre acreditei nisto e tenho simpatia pela obra de Nietzsche embora o conheça pouco. Sempre acreditei no diálogo e na busca de entendimento para que as pessoas pudessem de um modo ou de outro aprofundarem os encontros. Cada indivíduo é único e não é possível que duas pessoas se encaixem tão perfeitamente que nunca irrompam desentendimentos, dificuldades de convivência, faltas etc.

Em toda relação deve existir espaço para compartilharmos as frustrações tanto quanto as alegrias. Encontros se fazem com intimidade, não com familiaridade. Familiaridade requer convívio e atenção. Intimidade requer esforço porque se faz justamente pelo movimento de adentrar nas profundidades de outro ser, se faz no movimento de buscar o outro sem deixarmos de ser e com o que carregamos.

Intimidade se constrói, encontros e entendimentos se constroem mas também se renovam porque estamos em constante mudança e mesmo que fosse possível não mudar, ainda haveria em cada ser um infinito para se descobrir. Assim, não pode ser de outro modo. Não existem encaixes perfeitos, não somos peças de engrenagem.

Nunca aceitei que devemos deixar as trombadas, os desentendimentos e os problemas dos relacionamentos humanos quietos. Dar tempo ao tempo dizem... Passam as necessidades, as arestas se desgastam, os motivos íntimos desaparecem, os desejos minguam, os sentimentos se aquietam e se acomodam, os hábitos se sobrepõe, o raciocínio justifica e se inventam soluções.

Resolvido? Não acho. Morre alguma coisa em cada um, e o par, ou o grupo, perde a oportunidade de aprender, de evoluir no que chamam: humanidade. O tempo desgasta a dor mas também revela outras arestas, outros desentendimentos e deixamos novamente o tempo cuidar, ou melhor: descuidar.

Problemas encostados num canto como uma coisa quebrada por que passamos todo dia descuidados... Com o único cuidado de não olhar. Vamos juntando estas pequenas mortes e ficamos impacientes, intolerantes, com medo... Incorporamos desvios e silêncios pesados. Pequenas facas no grande e eterno amor ou amizade que muitas vezes não matam só as relações, matam as gentes mesmo.

Ninguém morre de amor, morremos sem amor mas amor não cai do céu, não se conquista empreendendo jornadas lá fora. Amar não é o objetivo, é o caminho. As grandes batalhas são sempre íntimas e assim, só as fazemos sós mas até lá o caminho não fazemos sozinhos.

O tempo sempre me pareceu bom para curar as feridas e as dores que se impõe na vida da gente quando nada mais se pode fazer: tempo do luto.

Para o que se pode fazer, para o que se deve fazer, deixar ao tempo só "resolve" por acomodamento, por desgaste, por eliminação de causa... E se for para eliminar as causas dos desentendimentos consideramos a possibilidade extrema do isolamento e do afastamento, da descrença no entendimento, na descrença na riqueza dos encontros e das partilhas.

Tanta gente neste caminho! Tanta desesperança e possibilidades que se perdem! Este é o caminho para o extremo do extremo que termina, como nos disse Manuel Bandeira na poesia "Preparação para a morte", com o "fim de todos os milagres".

Eu nunca quis esta trilha, queria algo diferente: errar, lutar, cuidar, aprofundar, mudar, inventar, criar, melhorar... Viver minha solidão inevitável, junto de outra solidão inevitável. Contradição?

Porém, menino que sou, impaciente, aprendiz e errante, ainda não tinha aprendido...

Verdade, já havia lido e ouvido mas não tinha aprendido que há um tempo para tudo, o tempo para cada acontecimento e cada acontecimento tem seu tempo, seu rítmo. Cada pessoa tem seu rítmo... Cada um de nós, infinitos que somos um para o outro, temos o próprio tempo, o próprio rítmo, movimento íntimo, jeito único...

O entendimento é busca incessante que se faz com esforço para não deixar que os desentendimentos deixem de ser problemas simplesmente porque o outro deixa de ser para nós.

Esforço incessante que mas que requer paciência e respeito pelos tempos... Combate difícil porque exige não somente a coragem de não retroceder diante do desconhecido que há em mim e no outro. Exige a busca, a força e o exercício da sabedoria e da paciência, de saber parar, de fazer silêncio, de ouvir, do respeito e da compreensão dos limites: meus, teus, deles, nossos, vossos e deles.

Enfim, eu que nada disto sabia de verdade mas que pensava saber, eu que estava mergulhado em reflexões e muitas angústias, queria entender o que não deu certo, queria entender sobre os relacionamentos: amizades, amores, relações familiares etc. Os que vivi, os que vi as pessoas viverem e os outros de que ouvira uma coisa ou outra. Os que deram certo, de um modo ou de outro, e os que se romperam...

Fui então em busca do nome do livro ou texto com a frase de Nietzsche mas encontrei no caminho uma prosa de Rubem Alves em que a cita. Li, gostei e esqueci: não era o tempo.

Vivi o luto, mas ainda não me conformava porque não havia entendido...

Alguns dias atrás, reencontrei a frase de Nietzsche e me lembrei do texto do Rubem, busquei, reli mas desta vez alguma coisa aconteceu diferente em mim. Fiquei ruminando, ruminante teimoso que sou. No fim da semana passada se fez uma luz que foi clareando e que começa a se tornar aos poucos entendimento, não só pela memória e pela razão, embora também o seja...

É só isto que deixo agora: este depoimento de aprendizado e a prosa de Rubem Alves que é linda e inspiradora... Provecho!

Uma boa semana para todos e que neste feriado o Senhor esteja convosco.

Beijos e abraços!

Tênis x Frescobol de Rubem Alves

Depois de muito meditar sobre o assunto concluí que os casamentos são de dois tipos: há os casamentos do tipo tênis e há os casamentos do tipo frescobol. Os casamentos do tipo tênis são uma fonte de raiva e ressentimentos e terminam sempre mal. Os casamentos do tipo frescobol são uma fonte de alegria e têm a chance de ter vida longa.

Explico-me. Para começar, uma afirmação de Nietzsche, com a qual concordo inteiramente. Dizia ele: ‘Ao pensar sobre a possibilidade do casamento cada um deveria se fazer a seguinte pergunta: ‘Você crê que seria capaz de conversar com prazer com esta pessoa até a sua velhice?' Tudo o mais no casamento é transitório, mas as relações que desafiam o tempo são aquelas construídas sobre a arte de conversar.’

Xerazade sabia disso. Sabia que os casamentos baseados nos prazeres da cama são sempre decapitados pela manhã, terminam em separação, pois os prazeres do sexo se esgotam rapidamente, terminam na morte, como no filme O império dos sentidos. Por isso, quando o sexo já estava morto na cama, e o amor não mais se podia dizer através dele, ela o ressuscitava pela magia da palavra: começava uma longa conversa, conversa sem fim, que deveria durar mil e uma noites. O sultão se calava e escutava as suas palavras como se fossem música. A música dos sons ou da palavra - é a sexualidade sob a forma da eternidade: é o amor que ressuscita sempre, depois de morrer. Há os carinhos que se fazem com o corpo e há os carinhos que se fazem com as palavras. E contrariamente ao que pensam os amantes inexperientes, fazer carinho com as palavras não é ficar repetindo o tempo todo: ‘Eu te amo, eu te amo...’ Barthes advertia: ‘Passada a primeira confissão, ‘eu te amo!' não quer dizer mais nada.’ É na conversa que o nosso verdadeiro corpo se mostra, não em sua nudez anatômica, mas em sua nudez poética. Recordo a sabedoria de Adélia Prado: ‘Erótica é a alma.’

O tênis é um jogo feroz. O seu objetivo é derrotar o adversário. E a sua derrota se revela no seu erro: o outro foi incapaz de devolver a bola. Joga-se tênis para fazer o outro errar. O bom jogador é aquele que tem a exata noção do ponto fraco do seu adversário, e é justamente para aí que ele vai dirigir a sua cortada - palavra muito sugestiva, que indica o seu objetivo sádico, que é o de cortar, interromper, derrotar. O prazer do tênis se encontra, portanto, justamente no momento em que o jogo não pode mais continuar porque o adversário foi colocado fora de jogo. Termina sempre com a alegria de um e a tristeza de outro.

O frescobol se parece muito com o tênis: dois jogadores, duas raquetes e uma bola. Só que, para o jogo ser bom, é preciso que nenhum dos dois perca. Se a bola veio meio torta, a gente sabe que não foi de propósito e faz o maior esforço do mundo para devolvê-la gostosa, no lugar certo, para que o outro possa pegá-la. Não existe adversário porque não há ninguém a ser derrotado. Aqui ou os dois ganham ou ninguém ganha. E ninguém fica feliz quando o outro erra - pois o que se deseja é que ninguém erre. O erro de um, no frescobol, é como ejaculação precoce: um acidente lamentável que não deveria ter acontecido, pois o gostoso mesmo é aquele ir e vir, ir e vir, ir e vir... E o que errou pede desculpas; e o que provocou o erro se sente culpado. Mas não tem importância: começa-se de novo este delicioso jogo em que ninguém marca pontos...

A bola: são as nossas fantasias, irrealidades, sonhos sob a forma de palavras. Conversar é ficar batendo sonho pra lá, sonho pra cá...

Mas há casais que jogam com os sonhos como se jogassem tênis. Ficam à espera do momento certo para a cortada. Camus anotava no seu diário pequenos fragmentos para os livros que pretendia escrever. Um deles, que se encontra nos Primeiros cadernos, é sobre este jogo de tênis:
‘Cena: o marido, a mulher, a galeria. O primeiro tem valor e gosta de brilhar. A segunda guarda silêncio, mas, com pequenas frases secas, destrói todos os propósitos do caro esposo. Desta forma marca constantemente a sua superioridade. O outro domina-se, mas sofre uma humilhação e é assim que nasce o ódio. Exemplo: com um sorriso: ‘Não se faça mais estúpido do que é, meu amigo'. A galeria torce e sorri pouco à vontade. Ele cora, aproxima-se dela, beija-lhe a mão suspirando: ‘Tens razão, minha querida\'. A situação está salva e o ódio vai aumentando.’

Tênis é assim: recebe-se o sonho do outro para destruí-lo, arrebentá-lo, como bolha de sabão... O que se busca é ter razão e o que se ganha é o distanciamento. Aqui, quem ganha sempre perde.

Já no frescobol é diferente: o sonho do outro é um brinquedo que deve ser preservado, pois se sabe que, se é sonho, é coisa delicada, do coração. O bom ouvinte é aquele que, ao falar, abre espaços para que as bolhas de sabão do outro voem livres. Bola vai, bola vem - cresce o amor... Ninguém ganha para que os dois ganhem. E se deseja então que o outro viva sempre, eternamente, para que o jogo nunca tenha fim...
Do livro:

O Retorno e Terno,
Crônicas de
Rubem Alves
Editora Papirus

Reflexões

Se escolhemos por não-ser, por não-viver, pelo conforto e pela segurança, então os caminhos são projeções do passado ou memórias de outros. Neste caso, viveremos a ilusão de que escolhemos o que é melhor, o que é mais seguro, o que é mas confortável...

Mas há a vida, há a alma e para os que fogem destas, elas os atingem como um tapa na cara quando menos esperam.

Porém se escolhemos pela vida, se escolhemos pelo ser, lançamo-nos nos terrenos do porvir, do desconhecido, das incertezas... Nos colocamos nas mãos de Deus, dos outros e do fluir das mudanças incessantes do universo e percebemos nossa fragilidade, nossos limites...

Somente assim podemos iniciar nossa jornada para o infinito.

Scorpio

"Sub omni lapide scorpio dormit"

Teu sorriso
Um ingresso
Ao paraíso

Ou quem sabe?
Um sincero
Aviso?

Qual esfinge,
Teu mistério
Atrái, constrói,
Espanta e corrói

Tua força, oculta
Ninguém controla
Teu medo
(Quase louco)
Te confunde
Te devora.

O melhor
É teu pensamento
livre

Teus sonhos
loucos

Tua dúvida
Constante,

Teu medo
Medo mola
Que te atira
E te devora.

16.08.85

Sonífero

Sono
Bono
Sem dono
Abandono
Sono
Bono

1985

Crescer

para meu filho João...

Menino sai de casa sonhando aventuras,
sente a ânsia do mundo, se arrisca,
faz artes, brinca no telhado, se lança sem dúvidas...

Menino que aprende das consequências de todo ato,
quebra uma coisa ali, faz alguém chorar, se machuca,
inventa verdades, esconde, se esconde...

- Gato escondido com o rabo de fora!

Menino que aprende os mistérios do karma,
mistérios dos mundos e das gentes,
mundo, vasto mundo, belo e perigoso...

Menino que cansa dos jogos e brincadeiras na rua,
cansa das aventuras, cansa de ser herói,
quer apenas voltar para o quarto e brincar só...

Menino que descobre que sabe muito pouco ainda,
percebe que há sempre mais para aprender,
sonha então ser homem que sabe tudo...

Menino que não percebe ainda,
que um homem se faz desde menino assim mesmo,
que homem mesmo aprende que foi e será sempre...

menino.

Frases e Imagens - Drummond

Frases e imagens - Sêneca

Frases e Imagens - Caio

Frases e Imagens - Clarice

Disparada

Uma das músicas que mais gosto é Disparada que foi composta por Geraldo Vandré e Theo de Barros. Gostaria de compartilhar com vocês alguns comentários sobre a letra e recomendar que a ouçam novamente na voz de Jair Rodrigues.

Prepare o seu coração
Prás coisas
Que eu vou contar
Eu venho lá do sertão
E posso não lhe agradar...

Os versos começam com a recomendação para que nos preparemos. A preparação é necessária para quase tudo em nossa vida mas especialmente para ouvirmos o outro. Quantas vezes realmente nos preparamos para ouvir o outro? Quantas vezes dedicamos alguns segundos de preparação para nos abrimos para a escuta, sem mediações do raciocínio e dos preconceitos?

Ainda mais quando o outro vêm de lugar distante onde nem tudo acontece no conforto e onde a verdade se revela entre o sol e a terra. Estamos acostumados aqui na cidade com tanto conforto, tantas facilidades e com aquela ilusão de civilidade que algumas vezes temos medo e nos afastamos dos fatos, acontecimentos e de nossas verdades.

Então por isto, é preciso a preparação do coração e da mente mas ainda assim, e por isto mesmo, o contador nos avisa que pode não agradar.

Aprendi a dizer não
Ver a morte sem chorar
E a morte, o destino, tudo
A morte e o destino, tudo
Estava fora do lugar
Eu vivo prá consertar...

Aqui ele se apresenta. Ele não é um homem que concorda com tudo, aprendeu a dizer não. Isto hoje em dia é raro e muitas vezes dizemos sim ou damos aparência de que concordamos com o que não acolhemos no coração por interesses ou conveniência. Porém isto nos tira do lugar.

Ele também aprendeu a aceitar a finitude da vida e os desígnios do destino. Um destino que parece se impor mas veja que ele é homem que aprendeu a dizer não. Ele não vive movido pelas forças circunstânciais mas também tem vontade e livre-arbítrio.

Este é um grande mistério mas é também uma verdade em que nem todos se detém devidamente. Estamos submetidos a morte, ao destino mas também podemos exercer nossas escolhas.

Então ele diz que a morte, o destino e tudo estariam fora de lugar. Por que? Porque na cabeça dos homens está assim. Tudo está e sempre estará em seu devido lugar queiramos ou não. Então ele se apresenta como um que vive para consertar. Parece um tanto arrogante afirmando que vive para consertar. Seria ele capaz? Vejamos...

Na boiada já fui boi
Mas um dia me montei
Não por um motivo meu
Ou de quem comigo houvesse
Que qualquer querer tivesse
Porém por necessidade
Do dono de uma boiada
Cujo vaqueiro morreu...

Este é um dos trechos mais belos na minha opinião... Na boiada já fui boi. De que boi ele nos fala? O boi é animal dócil que serve para o abate. Me lembro da professora na escolha que dizia que do boi o homem aproveita tudo! Você ainda está com o coração aberto? Feche os olhos para poder ver o boi no sertão...

Então acontece uma virada na vida deste homem e um dia ele se monta. Montar um animal parece fácil mas não é. Algum tempo atrás eu fazia aulas de equitação e vi que não é fácil. É preciso guiar e dirigir mas só se faz isto com respeito por aquele ser que te serve.

Então ele prossegue contado com palavras de uma beleza pura e fundamentais...

"Não por um motivo meu, ou de quem comigo houvesse." Não foi porque ele quis como tantas pessoas acham que fazem e dizem por ai. E veja só que ele fez isto mas não foi nem mesmo pelas pessoas queridas que estavam com ele. Ele compreende que fez isto por necessidade do dono de uma boiada. Fez pela necessidade de outro diante de uma fatalidade.

Não podemos nos montar por motivo próprio. É preciso respeito e consideração por nós mesmos. Se não houvesse isto ele não poderia se montar. Porém também é preciso respeito com o entendimento de que ninguém pode dominar e controlar os acontecimentos como lhe convém. Ele aceitou ser o vaqueiro, até porque ele era boi dócil e havia a necessidade de outro.

Boiadeiro muito tempo
Laço firme e braço forte
Muito gado, muita gente
Pela vida segurei
Seguia como num sonho
E boiadeiro era um rei...

Assim ele se tornou boiadeiro por muito tempo. O tempo é necessário para aprofundar e firmar os entendimentos assim como consolidar as experiências. Ele aqui professa que não foi um simples serviço de tocar boi... Ele tornou-se boiadeiro.

E como tal aprendeu a usar o laço firme e fez o braço forte. Esta imagem do laço firme e do braço forte me lembra a consciência que jogamos como um laço para o que escolhemos mas precisamos também desenvolver o braço forte para segurar com determinação.

Então ele revela com maior clareza do que se tratava a vida de boiadeiro: ao longo da vida ele segurou gado e gente. Se relemos isto depois de ouvir tudo dá para sentir a vergonha e o tom quase confessional em que diz que vivia "como num sonho" e se sentia rei.

Mas o mundo foi rodando
Nas patas do meu cavalo
E nos sonhos
Que fui sonhando
As visões se clareando
As visões se clareando
Até que um dia acordei...

Aqui acontece outra mudança mais lenta e gradual. Ele estava em movimento nas patas do seu cavalo e via o mundo rodar e neste movimento ele foi sonhando. Porém aqui ele nos fala de outros sonhos que despertam. Ele revela o contato com a alma e com o mundo e justamente por isto as visões foram se clareando até que um dia ele acordou!

Então não pude seguir
Valente em lugar tenente
E dono de gado e gente
Porque gado a gente marca
Tange, ferra, engorda e mata
Mas com gente é diferente...

Aqui ele revela a transformação do boiadeiro em homem, cantador e gente que vive para consertar... Ele não pode mais seguir sem receio, intrépido e com força quando ele acorda do sonho de boiadeiro rei. E confessa que descobriu que "gado a gente marca, tange, ferra, engorda e mata mas com gente é diferente...".

Eu adoro esta parte. Não é por achar que ele se torna bomzinho... Mas imagine que homem é este que de ser dócil é transformado e jogado nos sonhos de luta e poder mas que não perde contato com sua alma e um dia desperta e descobre algo que transforma sua vida.

Você ainda está com o coração aberto? Lembra do início da letra quando ele pede isto? Lembra que ele ia nos contar coisas do sertão? O que é o sertão para ti? Aonde está o teu sertão? Lembra que ele também avisou que podia não agradar? Ele então reafirma isto.

Se você não concordar
Não posso me desculpar
Não canto prá enganar
Vou pegar minha viola
Vou deixar você de lado
Vou cantar noutro lugar

Este homem se pôs para colocar as coisas no lugar mas ele sabe que nem todos vão concordar. Ele já foi boi, tornado boiadeiro viu o mundo rodar mas despertou destes sonhos de rei. Ele não pode se desculpar ainda que você não concorde porque sua mensagem tem verdade.

Ele não canta para enganar. Quantos cantam para enganar? Quantas distrações, idéias, filmes, livros, programas de TV e tanta coisa para nos enganar? Ele não quer isto e se é isto que você quer, ele vai te deixar e vai cantar em outro lugar.

E novamente ele repete a fórmula do início de sua transformação aprofundando um pouco mais....

Na boiada já fui boi
Boiadeiro já fui rei
Não por mim nem por ninguém
Que junto comigo houvesse
Que quisesse ou que pudesse
Por qualquer coisa de seu
Por qualquer coisa de seu
Querer ir mais longe
Do que eu...

Leia e medite novamente sobre o que ele diz porque o autor foi muito feliz nisto. Ele já foi rei mas não por ele, não por ninguém que estivesse com ele, não pelo querer ou pelo poder de ninguém... Nem por nada que fosse dos outros para ir mais longe do que ele.

E novamente indica a outra mudança mas também aprofundada:

Mas o mundo foi rodando
Nas patas do meu cavalo
E já que um dia montei
Agora sou cavaleiro
Laço firme e braço forte
Num reino que não tem rei

Aqui ele maravilhosamente encerra contando que um dia ele montou e agora ele é cavaleiro. Não é mais boiadeiro mas cavaleiro com laço firme e braço forte mas agora ele tem outro senhor e serve ao reino que não tem rei.



OBS: Em 1966 eu tinha menos de 1 ano mas sei que "Disparada" foi a finalista do II Festival da Música Popular Brasileira da Record junto com "A Banda" de Chico Buarque. Há que se destacar a recusa do Chico de receber o prémio sozinho forçando os organizadores a declarar um empate. Outros tempos que não vivi adulto mas que tenho saudades.

Post Familiar

Passando alguns dias no Rio e abrindo um espaço para meus amores escreverem aqui:

Diz o João

Hojenos fomos a praia ena casa de um amigo do meu pai tchau

Diz a Júlia

hoje nos fomos praia e foi muito legal e nos divertimos muito na casa da vovo. tchau

OBS: Teclaram eles mesmos e não mudei nada (papi orgulhoso).

Digo eu:

Rio, esta cidade, como certamente muitos outros lugares, necessita de tantas mudanças que além de necessárias são até urgentes para que as pessoas e os visitantes possam novamente voltar a falar dela como maravilhosa....

Porém, justamente porque foi aqui que eu nasci, cresci e que por viverem aqui tanta gente que eu amo e que desejo tanto bem, porque nos dias aqui eu reencontro as belezas das montanhas, das praias, reencontro a história de meu povo, da minha cidade e minha própria história...

Justamente por tudo isto e contagiado na alegria deste lindo dia de Outono eu canto:

O Rio de Janeiro continua lindo...



Praia da Barra da Tijuca - Posto 5 - Hoje!!!!

Chega de Saudade

O filme tem como cenário um salão de dança em São Paulo aonde diversos personagens se revelam aos poucos em uma trama que mistura comédia e drama e que fala de amor, solidão, desejos, amizade e traição, tudo bem misturado com boas músicas e belos passos de dança.

Como amante da dança de salão e dos bailes em casas como a que compõe o cenário do filme eu realmente seria suspeito mas o filme realmente vale a pena e tem um elenco ótimo inclusive com a participacão de Elza Soares animando a festa. Vale a pena!

Antes de Partir

Esta é uma dica de uma comédia dramática sobre dois homens, doentes terminais que decidem aproveitar seus últimos dias procurando realizar sonhos antigos e resolvendo questões que eles determinam com a "Lista da Bota" que dá o título em inglês do filme: The Bucket List - uma relação de tudo que desejam fazer e viver antes de baterem as botas.





Um filme que diverte e nos faz pensar sobre como temos vivido a vida... No elenco, o destaque para Jack Nicholson no papel do milionário que se transforma com a amizade de um sábio mecânico interpretado por Morgan Freeman. Vale a pena!




E ai? O que você vai por na tua lista?

A Fuga de Lot

Gen 19, 17

Quando já estavam fora, um dos anjos disse-lhe: “Salva-te, se queres conservar tua vida. Não olhes para trás, e não te detenhas em parte alguma da planície; mas foge para a montanha senão perecerás.




Gen 19, 26

A mulher de Lot, tendo olhado para trás, transformou-se numa coluna de sal.


Eu sempre advoguei pela utilidade de olhar para trás buscando aprender com as ações e acontecimentos passados identificando os erros e os acertos. Assim fazendo procuro não apenas me tornar uma pessoa melhor mas aprender como posso ajudar aos outros.

Porém, o ser humano é marcado pela liberdade e algumas pessoas fazem suas escolhas pelo bloqueio e pela negação das possibilidades de aprendizado e evolução. E escolhas como estas são quase sempre danosas não apenas para estas pessoas como para os que estão com elas.

Assim, nem sempre é conveniente ficar e insistir principalmente quando já fizemos todos os esforços possíveis para evitarmos ou corrigir situações que consideramos perigosas e danosas tanto para os outros como para nós mesmos.

Não se pode esquecer que os avisos e sinais, como os anjos, vêm para todos e ninguém pode argumentar que não foi avisado e chamado. Só nos resta então, reconhecer a liberdade e a responsabilidade de cada ser com seu destino.

Nestes momentos trágicos, devemos ter a coragem de deixar os lugares e as coisas com que nos acostumamos, assim como as pessoas queridas que insistem em ficar e devemos seguir ainda que sem saber para onde ir ou sem ter ideia de como será o futuro.

E nesta fuga da destruição da vida e do que nos faz mal e que está além de nosso controle porque é fruto da escolha de outros, não devemos olhar para trás. Porque neste caso pelo menos, olhar para trás por qualquer motivo compromete seriamente as vidas que buscamos salvar.

A Roda da Fortuna

Não sei bem do que escrever hoje. Ou melhor... Tenho vontade de escrever sobre coisas demais. Tantos assuntos que se entupiram na minha cabeça em uma briga frenética e não sai nada que preste.

Um turbilhão de pensamentos, lembranças, saudades, desejos, sonhos, idéias, intuições... Uma mistura de fluxos bons e maus. Tudo ali lutando para entrar na mora desta luz que minha consciência lança sobre um ou outro em busca de entendimento.

Tudo embaralhado aqui dentro e ao mesmo tempo tudo fora da minha vida porque nada é além do aqui e agora. No entanto, inegável que são forças e provocam reações em mim.

Isto deveria estar na minha vida? Porque não está? Poderia ter sido de outro modo? E se eu fizer algo? Pode ser de outro modo? Fiz... Não fiz... Faço... Não faço...

Ah tentação da raça humana! A armadinha de raciocinar sobre o que não é. Tomar posse das coisas, dos saberes, das almas e de si.

Ontem fiz uma experiência com o Tarot, tirei a carta "A Roda da Fortuna" aonde as três Moiras responsáveis pela Roda tecem o fio da vida dos homens na escuridão de sua gruta. Uma delas tece, outra mede e a outra corta.

Conhecer o futuro não aquieta a alma. Tão pouco aquieta a lembrança dos acontecimentos bons ou dos erros do passado. Também não aquieta conhecer e ver o que há no presente se acabamos olhando o invizível ou além das ilusões.

Hoje, só queria saber menos, ver menos e ter mais paz. Por isto, vou me levantar, lavar a louça do café, arrumar a casa, lavar a roupa, preparar o almoço, sentar na poltrona e ver TV, talvez... Durante a tarde me sente no chão para organizar papeis.

Assim espero estar pronto para as mudanças: tranquilo e com a casa arrumada.

Domingo de Páscoa

Páscoa é celebração de mudanças, de libertação e da vitória da morte sobre a vida. Uma vez ouvi que deveriamos fazer todo dia celebração destas mudanças mas a verdade é que por vários motivos e razões acabamos envolvidos pelo mal e deixamos a morte e a escravidão vencerem.

O mal é curioso. Ao contrário de algumas pessoas, para mim ele é real e mesmo que não possa descrever, definir e nem mesmo posso sempre identificar o mal, vejo que ele é real e que nos atinge como atinge aos outros o mal que fazemos, querendo ou não.

Lembre que sempre teremos a razão, a lógica, os sentimentos e toda a nossa psiquê para explicar e justificar tudo que fizemos: mal e bem. De que adianta então nos fiarmos nestes guias se não levam a gente para a paz, o amor e a justiça?

Além do mais cabe lembrar que o mal raramente nos chega como algo ruim, feio, odioso e prejudicial... Algumas vezes vem com as melhores intenções e "para nosso bem".

Assim se diz: orai e vigiai.

Cada ato e cada pensamento para mim são como pedras que lançamos ao lago. Geramos sempre um desequilibrio que se propaga. Cada ato nosso é como uma onda de energia que se reflete, sofre refração ou que é absorvida pelas outras pessoas, animais e coisas.

Assim, todos nós querendo ou não, ativos ou passivos somos parte deste lago e de qualquer modo seremos responsáveis pelas ondas que nos chegam e saem de nós.

Também nunca estaremos livres do mal (destas perturbações que vem de fora) mas podemos escolher como vamos reagir ao que nos acontece. Vamos retransmitir? Vamos amplificar o que recebemos? Vamos atenuar e trabalhar para não retransmitir isto?

Como podemos fazer isto de verdade e sem nos enganarmos ou enganarmos aos outros mas também com dignidade e sem nos tornamos um poço de coisas ruins? Podemos transformar uma energia ruim em uma coisa boa que possamos dar aos outros?

Sozinhos não podemos. Porém podemos buscar e beber das verdadeiras fontes das energias boas que trazem a vida e a libertação. As fontes de paz, amor e justiça. Estas fontes estão por ai e sempre, sempre, sempre a nossa disposição...

Somente buscando e bebendo destas fontes poderemos ter forças para combater o mal e sermos nós mesmos luz e sal para dar guiar, ajudar, dar graça e forças aos outros.

Se nos fazem algo de ruim, não podemos achar que vamos simplesmente esquecer de uma hora para outra mas podemos buscar entender as causas e mesmo sem concordar podemos escolher como reagir sem perpetuar e sem compactuar com o mal.

Se recebemos algo ruim e conseguimos, pelo menos não passar isto adiante, receberemos menos coisas ruins depois e as pessoas também. Se além disto, conseguirmos passar algo bom, receberemos boas novas. Esta é minha crença.

Hoje, vamos começar a deixar o que é do passado no passado e cuidar do presente. Vamos pensar que podemos justificar muitos atos mas nem sempre precisamos escolher por tudo que podemos justificar.

"Tudo me é permitido mas nem tudo me convém." [1 Cor]

Vamos fazer o podemos com o que existe e temos ao alcance sem sonhar o impossível mas fazendo e buscando o possível. Sem tentar segurar a pedra que já caiu, mas possamos carregar nossas pedras e sem jogar nos outros.

Buscar e beber das fontes que nos ajudam a buscar a verdade, o que nos fortalece e nos afasta do mal. Fechar os olhos para recordar do passado e tirar de lá lições mas sem imaginar que o passado se prolonga ao futuro.

Entre o passado e o futuro estamos nós. Possamos abrir os olhos arregaçar as mangas e com coragem e esperança, construir o futuro.

Para todos, um bom Domingo de Páscoa, uma boa semana e uma Vida Nova de verdade!

Não Desperdicem Um Só Pensamento

Bertolt Brecht

1

Não desperdicem um só pensamento
Com o que não pode mudar!
Não levantem um dedo
Para o que não pode ser melhorado!
Com o que não pode ser salvo
Não vertam uma lágrima! Mas
O que existe distribuam aos famintos
Façam realizar-se o possível e esmaguem
Esmaguem o patife egoísta que lhes atrapalha os
            movimentos
Quando retiram do poço seu irmão, com as cordas
            que existem em abundância.
Não desperdicem um só pensamento com o que
            não muda!
Mas retirem toda a humanidade sofredora do poço
Com as cordas que existem em abundância!

2

Que triunfo significa o que é útil!
Mesmo o alpinista sem amarras, que nada prometeu a
            ninguém, somente a si mesmo
Alegra-se ao alcançar o topo e triunfar
Porque sua força lhe foi útil ali, e portanto também
            o seria
Em outro lugar. E após ele vêm os homens
Arrastando seus instrumentos e suas medidas ao pico
            agora escalável
Instrumentos que avaliam o tempo para ao camponeses
E para os aviões.

3

Aquele sentimento de participação e triunfo
De que somos tomados ante as imagens da revolta no
            encouraçado Potemkin
No instante em que os marinheiros jogam seus algozes
            na água
É o mesmo sentimento de participação e triunfo
Ante as imagens que nos mostram o primeiro vôo sobre
            o Pólo Sul.

Eu presenciei como
Mesmo os exploradores foram tomados por aquele
            sentimento
Diante da ação dos marinheiros revolucionários: assim
Até mesmo a escória participou
Da irresistível sedução do Possível, e das severas alegrias
            da Lógica.

Assim como os técnicos desejam por fim dirigir na
            velocidade máxima
O carro sempre aperfeiçoado e construído com tamanho
            esforço
Para dele extrair tudo o que possui, e o camponês deseja
Retalhar a terra com o arado novo, assim como os
            construtores de ponte
Querem largar a draga gigante sobre o cascalho do rio

Também nós desejamos dirigir o máximo e levar ao fim
A obra de aperfeiçoamento deste planeta
Para toda a humanidade vivente.