Me lembrei hoje de uma senhora que conheci numa casa de repouso que eu costumava visitar. Esta senhora aposentada, fora auditora do tesouro federal, casara e criara suas duas filhas. O lugar era bem cuidado como ela também. Tinha boa comida, abrigo e a atenção das enfermeiras bem pagas e vestidas em seus uniformes impecáveis.
Me lembro em especial de um dia em que esta senhora nos disse de como gostava de nos ver lá. Ela tinha um problema de saúde que realmente tornava difícil para qualquer um estar ao lado dela sem bastante esforço. Não vou descrever o problema porque não quero agredir ninguém. Basta que entendam que realmente devia ser muito difícil para as filhas dela. Ela era uma pessoa inteligente e bem humorada mas nos confessou que se sentia muito só porque as filhas dela não a visitavam com frequencia e não tinha o convívio com a família.
Também me contou contente que já tinha um neto mas que ainda não o conhecia. O garoto já tinha alguns anos... Ela também me disse, quase que como um aviso - "Ainda bem que não dependo de minhas filhas e tenho minha aposentadoria para poder pagar esta casa!".
Nunca me esqueci disto e principalmente nos últimos dias de vida de minha avó. Ela morreu em um hospital público. Nos seus últimos dias quando não estava no leito ou nos corredores do hospital, vivia em casa sob os cuidados das filhas.
Ela também teve vários problemas de saúde e também era difícil estar com ela. Infelizmente ela só recebia uma pensão de meu avô que morreu bem cedo: um salário mínimo. A vida nunca lhe facilitou as coisas, desde menina pelo que sei foi assim. Tudo certo, afinal sabemos todos que só à poucos a vida passa sem dificuldades.
Tenho quase que certeza de que quase tudo que ela mais quis na vida foi poder ver os filhos e netos crescidos e felizes. Me lembro de quando ela pagou uma promessa que fizera se estivesse viva quando eu fizesse quinze anos. Achava que ia morrer antes... E a velha ainda viu todos os netos!
Minha avó viveu do modo que pode e sabia, não teve toda a assistência de que precisou e nos últimos dias viveu na total dependência dos outros.
Sentimos falta da Dona Margarida. Sinto sua falta agora mas quando me vieram estas lembranças, voltei a sentir sua presença e percebi como dependo dos outros.
E isto é bom.