Intimidades

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Li agora um trecho do livro "Uma Aprendizagem ou O Livro dos Prazeres". Este trecho é o momento em que Lori e Ulisses conversam na piscina:

- Por que é que você olha tão demoradamente cada pessoa?

Ela corou:

- Não sabia que você estava me observando. Não é por nada que olho: é que eu gosto de ver as pessoas sendo.

Então estranhou-se a si própria e isso parecia levá-la a uma vertigem. É que ela própria, por estranhar-se, estava sendo. Mesmo arriscando que Ulisses não percebesse, disse-lhe bem baixo:

- Estou sendo...
- Como? perguntou ele àquele sussurro de voz de Lóri.
- Nada, não importa.
- Importa sim. Quer fazer o favor de repetir?

Ela se tornou mais humilde, porque já perdera o estranho e encantado momento em que estivera sendo:

- Eu disse para você - Ulisses, estou sendo.

Ele examinou-a e por um momento estranhou-a, aquele rosto familiar de mulher. Ele se estranhou, e entendeu Lóri: ele estava sendo.


Ficaram calados como se os dois pela primeira vez se tivessem encontrado. Estavam sendo.

- Eu também, disse baixo Ulisses.

Ambos sabiam que esse era um grande passo dado na aprendizagem. E não havia perigo de gastar este sentimento com medo de perdê-lo, porque ser era infinito, de um infinito de ondas do mar.


Me lembro da distinção entre a familiaridade e a intimidade. Aprendi isto no ano passado e anotei para publicar no blog mas não me lembro agora se o fiz...

Eram reflexões sobre as diferenças entre as duas palavras que incluíam algumas divagações etimológicas (ambas do latim: familìa,ae e intìmus). Acho que não publiquei...

Enfim, resumindo... Familiaridade tem relação com convivência e intimidade tem relação com afeição, profundidade, essência, cumplicidade e tudo que está protegido dos descuidados...

Provavelmente teremos grande familiaridade com uma pessoa que vemos todos os dias mas nem sempre privaremos de sua intimidade. Por outro lado, ouso dizer que privo da intimidade de várias pessoas com quem não tenho e não tive a menor familiaridade.

E esta intimidade é uma das maiores graças da vida porque nos faz compreender que as pessoas e todo o mundo ao nosso redor não são ilusões.

Existem sim os que experimentam, sentem, aprendem, vivem e são! E também estão submetidos à mesma condição humana que nos põe todos no mundo, a princípio, essencialmente sós.

Escrevo somente para vocês que sabem por experiência do que estou falando... Vós sois o sentido e a razão deste espaço e parte das minhas alegrias.

Obrigado!